💣💥CASO GAEL - Mãe é investigada por morte de menino de 3 anos

Stalking (em português, “perseguição insistente”) é um termo inglês que designa uma forma de violência na qual o sujeito ou sujeitos ativos invadem repetidamente a esfera de intimidade ou privacidade da vítima, exercendo certa influência em seu emocional, coagindo-a empregando táticas de: Perseguição e meios diversos, tais como: ligações telefônicas, envio de mensagens pelo SMS ou por correio eletrônico, publicação de fatos ou boatos em sites da Internet (cyberstalking), remessa de presentes, espera de sua passagem nos lugares que frequenta, prática de constrangimentos públicos e coletivos direcionados, tratamento de menoscabo, desprezo e inferioridade, xingamentos e gritarias sem razão, apontar defeitos imaginários, menosprezar as suas conquistas e planos, culpar a vítima pelos abusos sofridos, ameaçar, divulgação de boatos mentirosos, divulgação de que a vítima está louca para a sociedade e perdeu a razão, destratar as opiniões da vítima, perseguir e apontar a vítima para terceiros turbarem publicamente, etc. - resultando dano à sua integridade psicológica e emocional, restrição à sua liberdade de locomoção ou lesão à sua reputação. Enfim, o stalker age de diversas maneiras, sendo sua conduta marcada pela característica da repetição, insistência.
Os motivos dessa prática podem ser os mais variados: violência doméstica, inveja, vingança, ódio, simples brincadeira ou qualquer outra causa subjetiva.
Em
diversos lugares mulheres sofrem perseguição de parceiros e ex-parceiros. Em
regra, essa conduta ocorre no momento do término do relacionamento ou em razão
da rejeição de uma proposta amorosa.
Dessa
forma nota-se que a maioria das vítimas alvo de stalkers são
mulheres, sendo assim, importante verificar também a abordagem dada pela Lei
n.º 11.340/2006,
conhecida como Lei Maria da Penha:
Art. 5º. Para os efeitos desta
Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou
omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual
ou psicológico e dano moral ou patrimonial: III - em qualquer relação íntima de
afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente
de coabitação.
Art. 7º. São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação.
A Lei Maria da Penha, como se nota, não abrange todas as condutas que podem ser consideradas como stalking , mas, evidentemente, assegura maior proteção às mulheres. A perseguição, ainda que não reiterada, configura violência psicológica contra a mulher prevista na Lei Maria da Penha e autoriza o deferimento de medidas protetivas para sua proteção: Trata-se de interpretação autêntica em razão do disposto no artigo 24-A, §1º, da Lei Maria da Penha: "A configuração do crime (de descumprimento de medidas protetivas) independe da competência civil ou criminal do juiz que deferiu as medidas". Assim, a própria lei dispõe que há medidas civis, deferidas por um juiz civil, fazendo cair por terra a alegação de que as medidas urgentes devem estar vinculadas a um procedimento criminal.
A origem do termo Stalking
Utilizada na prática de caça, esta palavra decorre do
verbo to stalk, que numa tradução aproximada para o português,
corresponde a 'perseguir incessantemente'. No contexto de caça, ocorre quando o
predador persegue a presa de forma contínua. Os stalkers perseguem
insistentemente outra pessoa, seguindo-a, procurando obter informações sobre
ela e tentando controlar sua vida, causando-lhe danos psicológicos.
No mundo
A National
Violence Against Women Survey ("Pesquisa Nacional sobre Violência
contra as Mulheres"), realizada pelo Center for Policy Research de Denver,
Colorado, com patrocínio do National
Institute of Justice e dos Centers for Disease Control and
Prevention, adotou a seguinte definição de stalking: Um curso de conduta
direcionado a uma pessoa específica e que envolva repetitivas aproximações
físicas ou visuais; comunicação não consensual; ameaças verbais, escritas ou
implícitas ou uma combinação [dessas táticas], de modo a causar temor a uma
pessoa razoável.
Há estimativas de que nos Estados Unidos há cerca de 1 milhão de mulheres e 400 mil homens tenham sido vítimas de stalking no ano de 2002. Na Inglaterra, a cada ano, 600 mil homens e 250 mil mulheres são perseguidos. Em Viena, Áustria, desde 1996, existem informes da ocorrência de 40 mil casos; em 2004, em um grupo de mil mulheres entrevistadas por telefone, pelo menos uma em cada quatro foi molestada dessa forma.
No Brasil
Na
legislação brasileira o stalking era configurado com contravenção
penal
(perturbação da tranquilidade) até a
aprovação e sanção da Lei nº 14.132/2021, que tipificou essa conduta como crime, ao acrescentar o
Art. 147-A ao Código Penal, com a seguinte redação:
“Perseguição Art. 147-A. Perseguir alguém,
reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou
psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma,
invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade.
Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois)
anos, e multa.
§ 1º A pena é aumentada de metade se o
crime é cometido: I – contra criança, adolescente ou idoso; II – contra
mulher por razões da condição de sexo feminino, nos termos do
§ 2 º A do art. 121 deste Código; III –
mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas ou com o emprego de arma. § 2º As
penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência.
§ 3ºSomente se procede mediante representação.”
Para fins didáticos a nova lei revogou expressamente o artigo 65
da Lei das Contravenções Penais, o que tem gerado inúmeras controvérsias. Tem
prevalecido o entendimento de que essa revogação não importa em abolitio criminis para
condutas que hoje estão abarcadas pelo tipo penal do artigo 147-A do CP como um
fato mais grave. Isso porque o legislador não considerou um insignificante
penal a perturbação reiterada à tranquilidade, mas, sim, elevou essa conduta à
categoria de crime.
Rogério Sanches Cunha salienta:
"Havia quem sustentasse que a própria
contravenção penal, em qualquer circunstância, tinha como característica a
reiteração de ações, pois um ato isolado não seria capaz de realmente
importunar alguém ou de perturbar-lhe o sossego. As condutas que, praticadas
reiteradamente, se revestiram das demais características do artigo 147-A sem
dúvida continuam puníveis em razão do princípio da continuidade
normativo-típica, modificando-se apenas a forma de punição. Nesse caso, deve
ser respeitada a pena anterior, pois a atual, mais severa, é
irretroativa".
Na mesma linha de entendimento, Alice
Bianchini e Thiago Pierobom de Ávila:
"A nova lei, ao tempo em que alargou o
âmbito qualitativo (uma perseguição que gere ataques à liberdade, não apenas à
tranquilidade), exigiu uma intensidade quantitativa maior (não basta um único
episódio, é necessário que seja reiteradamente). Portanto, como já dito, para
as condutas antigas de perturbação da tranquilidade que foram praticadas de
forma reiterada, com acinte e motivo reprovável, e que tenham gerado uma
perturbação da esfera de liberdade ou privacidade da vítima, não há que se
falar em abolitio criminis".
Interessante questionamento no que diz respeito às
condutas que se iniciaram antes do tipo penal do artigo 147-A do CP e
permaneceram após sua vigência: É possível considerar os atos anteriores de
perturbação da tranquilidade como integrantes da conduta causal do artigo 147-A
do CP? Exemplificando uma situação em que um perseguidor contumaz tenha seguido
a vítima por meses e, após a vigência do novo tipo, tenha seguido a vítima ao
menos uma vez, essa conduta, que configurava perturbação à tranquilidade e não
foi abolida da legislação (nos termos acima expostos), soma-se à conduta
posterior para configurar a reiteração necessária à caracterização do tipo
penal.
Lembrando que por se tratar de uma conduta que se alonga no
tempo, em razão da reiteração, torna-se interessante lembrar da aplicação a
Súmula 711 do STF:
"Súmula 711 - A lei penal mais grave
aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é
anterior à cessação da continuidade ou da permanência".
Além do crime de perseguição, responderá o agente pela violência
praticada contra a vítima em concurso formal impróprio com aplicação cumulativa
das penas (artigo 70, parte final, CP). Ainda que a violência não importe em
marcas físicas, a conduta de perseguição pode gerar danos à saúde da vítima. É,
aliás, o que ocorre com frequência.
Estudos apontam que vítimas de stalking sofrem impactos em sua saúde
física e mental, por vezes tão severos que as impedem de trabalhar, estudar e
praticar atos rotineiros. Se a conduta de perseguição causar danos à saúde
psicológica da vítima que a impeçam de trabalhar, estudar e praticar atividades
rotineiras por mais de 30 dias, haverá crime de lesão corporal de natureza
grave em concurso com o crime de perseguição (artigo 129, § 1º, I, CP, e artigo
147-A, CP, cc. artigo 70, parte final, CP). Esse período deve ser aferido
segundo critério funcional, tendo-se em conta não só o trabalho, mas também as
atividades familiares, sociais da vítima e até atividades esportivas:
"Qualquer ocupação de natureza habitual
está abrangida no inciso I. Assim, aquele que fica impedido de trabalhar por um
período superior a 30 dias se amolda à modalidade qualificada de lesão
corporal, da mesma forma que aquele que deixa de praticar suas atividades
esportivas".
No Brasil, o Formulário
Nacional de Avaliação de Risco, aprovado pela Resolução Conjunta CNJ e CNMP nº
05, prevê diversas condutas que podem ser identificadas com o stalking: "Bloco 1 — Sobre
o histórico da violência:
6. O(A) agressor(a) já teve
algum destes comportamentos?
( ) disse algo parecido com a
frase: 'se não for minha, não será de mais ninguém'
( ) perturbou, perseguiu ou vigiou você nos
locais em que frequenta
( ) proibiu você de visitar
familiares ou amigos
( ) proibiu você de trabalhar
ou estudar
( ) fez telefonemas, enviou mensagens pelo
celular ou e-mails de forma insistente
( ) impediu você de ter
acesso a dinheiro, conta bancária ou outros bens (como documentos
pessoais, carro)
( ) teve outros comportamentos de ciúme
excessivo e de controle sobre você
( ) nenhum dos
comportamentos acima listados" (grifos da autora).
Nos tribunais superiores também há decisões pela
autonomia das medidas protetivas:
"2019-STF — Agravo regimental em habeas
corpus. 2. Vigência alongada das medidas protetivas. Lei Maria da Penha. Desnecessidade de processo penal ou
cível. 3. Medidas que acautelam a ofendida e não o processo. 4. Agravo a que se nega
provimento". (Ag. Reg. no Habeas Corpus nº 155187/MG, 2ª
Turma do STF, Rel. Gilmar Mendes. j. 05.04.2019, unânime, DJe
16.04.2019 — grifo da autora)
"2018-STJ — A própria lei maria da penha não dá
origem a dúvidas, de que as medidas protetivas não são acessórias de processos
principais e nem a eles se vinculam. Assemelham-se aos writs constitucionais que, como o habeas corpus ou o
mandado de segurança, não protegem processos, mas direitos fundamentais do
indivíduo. São,
portanto, medidas cautelares inominadas, que visam garantir direitos
fundamentais e "coibir a violência" no âmbito das relações familiares, conforme preconiza a constituição
federal (artigo 226, § 8º)". (DIAS. Maria Berenice.
"A Lei Maria da Penha na justiça". 3 ed. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2012, p. 149 — grifos da autora). In casu, as medidas
protetivas foram mantidas pelo Tribunal de origem, tendo em vista o seu
descumprimento, o que não evidencia constrangimento ilegal. Recurso ordinário a
que se nega provimento (Recurso em Habeas Corpus nº 87.613/MG
(2017/0185001-5), STJ, Rel. Maria Thereza de Assis Moura. DJe 23.03.2018).
Diante do todo o exposto e a título de primeiras considerações sobre a nova lei, pode-se concluir que:
1) Condutas anteriores de perturbação à tranquilidade remanescem como violência psicológica na Lei Maria da Penha e conferem à mulher o direito de proteção, ainda que não tenham correspondência típica;
2) Nesses casos, permanecem vigentes as medidas protetivas
deferidas anteriormente como medidas civis, salvo expressa decisão em
contrário;
3) A prática reiterada de perturbação à tranquilidade, anterior
ao tipo penal do artigo 147-A CP, integra a reiteração de conduta exigida pelo
novo crime;
4) Se a conduta de perseguição causar danos à saúde psicológica
da vítima que a impeçam de trabalhar, estudar e praticar atividades rotineiras
por mais de 30 dias, haverá crime de lesão corporal de natureza grave em
concurso com o crime de perseguição (artigo 129, §1º, I, CP, e artigo 147-A,
CP, cc. artigo 70, parte final, CP).
Fonte: Site Conjur.
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